A Origem do Mundo


 I - Obras de Deus

As obras de Deus, de acordo com a doutrina católica tradicional, se dividem em duas categorias fundamentais: os seres espirituais, representados pelos anjos, e os seres corporais, que englobam o mundo e o homem.

Para uma compreensão mais precisa, é importante destacar que o termo "mundo" é muitas vezes substituído por "universo" para abranger não apenas o planeta em que habitamos, mas também todos os seres que povoam esse vasto cosmos.

 

1 - A Origem do Mundo

A questão da origem do mundo possui dois significados: o primeiro se refere à origem da matéria que constitui o mundo, e o segundo aborda a formação do universo com ordem e harmonia.

A narrativa da criação mosaica, presente no Gênesis (Gn 1, 1-27; 2, 1-2), é fundamental para compreendermos essa perspectiva.

No primeiro dia, Deus criou a luz e as trevas, estabelecendo o ciclo do dia e da noite.

No segundo dia, formou o firmamento, dando origem aos céus.

No terceiro dia, criou a Terra, os mares e toda a vida que nela habita, incluindo plantas, sementes, árvores e frutos.

No quarto dia, surgiram o Sol, a Lua e as estrelas.

No quinto dia, Deus deu vida aos peixes, aves e animais aquáticos.

No sexto dia, criou o homem e a mulher.

No sétimo dia, Deus descansou da obra da criação, estabelecendo o Dia Santo.

 

Elemento Teológico:

Do ponto de vista teológico, essa narrativa dogmática ensina ao povo a ideia da criação divina, enfatizando que Deus, como único criador, deu origem ao universo. Isso reforça a obrigação do homem de ser grato a Deus por reinar sobre toda a criação.

Além disso, o culto divino é o centro da espiritualidade, e o sábado é consagrado a Deus como um dia de descanso e culto, seguindo o modelo divino da semana de seis dias de trabalho e um dia de descanso.

 

Elemento Científico:

A perspectiva científica, ao absorver a narrativa mosaica, compreende que o autor sagrado não tinha a intenção de ensinar detalhes sobre a formação das coisas visíveis, pois isso não seria relevante para a salvação. Portanto, ele recorreu a metáforas e linguagem comum para transmitir ensinamentos religiosos.

O objetivo do autor sagrado não era fornecer conhecimento científico, mas sim transmitir uma compreensão ao nível do povo. A narração da criação é, assim, uma explicação popular das origens do mundo e do homem, envolvendo elementos científicos da época, e transmitindo um ensino que visa o sentido religioso do texto.

 

2 - Afirmações Dogmáticas da Fé

A teologia católica tradicional estabelece algumas afirmações dogmáticas fundamentais relacionadas à origem do mundo:

A - Origem do Mundo

a) Criação do Universo: A fé católica ensina que Deus é o criador do universo em sua totalidade, tanto em sua estrutura quanto na matéria que o compõe.

b) Criação Direta e Indireta das Criaturas: Deus criou tanto diretamente como indiretamente as criaturas, de acordo com seu plano divino.

c) Criação Especial do Homem: A teologia católica tradicional afirma que o homem foi criado de forma especial por Deus, à Sua imagem e semelhança.

 

B - Formação do Mundo

No que diz respeito à formação do mundo, a teologia católica tradicional não estabelece dogmas específicos, deixando espaço para pesquisadores explorarem essa questão de acordo com a ciência.

 

3 - Origem do Mundo e dos Seres Vivos Segundo a Ciência

A ciência ainda não oferece uma solução definitiva para a origem da matéria, e não há evidências que sustentem a ideia de que a matéria seja eterna. A teoria da evolução materialista, que nega a existência de Deus, carece de base experimental sólida.

No entanto, há teorias científicas, como a hipótese de Laplace-Faye, que exploram a formação do mundo com base em observações geológicas e paleontológicas. Essas teorias sugerem que o mundo e os planetas surgiram de uma massa gasosa, condensando-se ao longo do tempo.

Quanto à origem dos seres vivos, existem duas principais hipóteses:

O Criacionismo que defende que Deus criou todas as espécies de forma direta e que elas não passaram por transformações ou evoluções.

O Transformismo argumenta que as espécies surgiram por meio de processos evolutivos, com base em mudanças ambientais e seleção natural. Isso inclui teorias como a de Lamarck e a de Darwin.

A teologia católica tradicional não vê necessariamente conflito entre essas teorias e a fé, desde que se reconheça que Deus está na base da criação, mesmo que de maneira indireta.

 

4 - Não Há Conflito entre Ensinos de Fé e Ciência

A teologia católica tradicional defende que não há conflito real entre os ensinos de fé e a ciência. As afirmações dogmáticas da fé não são abaladas pelas descobertas científicas, mas algumas hipóteses científicas podem ser questionadas.

a) Origem da Matéria: A doutrina católica aceita que a ciência explore diferentes hipóteses sobre a origem da matéria, desde que Deus seja reconhecido como o criador.

b) Origem dos Seres Vivos: A teologia católica tradicional concorda que a vida e os seres vivos têm sua origem em Deus, seja de forma direta ou indireta, e que Deus é o responsável pela existência da alma humana.

 

Formação do Mundo: Uma Ponte entre Fé e Ciência

A questão da formação do mundo sempre intrigou tanto os cientistas quanto os religiosos. Pode a fé católica, por exemplo, admitir a hipótese de Laplace, que desafia a narrativa do Gênesis? A resposta não é tão simples quanto parece.

É importante observar que a cosmogonia e a narração do Gênesis não se alinham completamente. O Gênesis descreve a criação das plantas no terceiro dia, enquanto o sol é criado no quarto dia. Os répteis surgem no sexto dia, antes dos pássaros no quinto dia. No entanto, a paleontologia nos mostra que os fósseis de répteis são anteriores aos dos pássaros. Isso nos leva a considerar que a narrativa do Gênesis não deve ser interpretada estritamente no sentido literal, e que a palavra "dia" pode ter um significado mais amplo.

Aqui reside a ideia de que não há oposição intrínseca entre a fé e a ciência. A fé pode abraçar várias hipóteses relacionadas à criação da matéria, como a hipótese de Laplace, desde que reconheça que a narrativa religiosa pode ser uma representação simbólica.

 

Origem dos Seres Vivos: O Debate entre Transformismo Absoluto e Restrito

Quando se trata da origem dos seres vivos, surgem duas abordagens: o transformismo absoluto e o transformismo restrito.

O transformismo absoluto parece entrar em conflito com a fé, pois implica na existência da matéria eterna, na geração espontânea e na evolução das espécies. No entanto, a fé afirma que a matéria foi criada no tempo e que outras teorias são precipitadas.

A razão também questiona a evolução da matéria eterna, argumentando que as mudanças sucessivas no mundo não podem ser infinitas, pois um número finito não pode ser infinito.

Além disso, a experiência não apoia o transformismo absoluto, com cientistas como Pasteur e Tyndall demonstrando que a teoria da geração espontânea é cientificamente infundada.

Por outro lado, o transformismo restrito pode ser mais compatível com a fé, desde que Deus seja reconhecido como o criador das espécies de forma indireta. As ordens dadas por Deus no Gênesis não excluem explicitamente a possibilidade de evolução das espécies, o que sugere que a evolução não é necessariamente contrária à Tradição.

A história da Igreja também oferece exemplos de aceitação de algumas formas de transformismo, como a geração espontânea de seres na água parada, conforme ensinado por alguns Padres da Igreja.

A teologia católica tradicional ensina que Deus é o criador do universo e de todas as coisas. A narrativa da criação na Bíblia é vista como uma explicação religiosa, não científica, das origens, e não há necessariamente um conflito entre fé e ciência, desde que se reconheça a primazia de Deus na criação. A Igreja Católica permite a exploração da teoria da evolução, contanto que se respeite a dignidade do homem e a criação direta da alma por Deus.

Fonte Utilizada: 

Doutrina Católica do Cônego Auguste Boulenger

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